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Opinião

AERUS: Por uma Comissão da Verdade de verdade

José Carlos Bolognese

 

O falecido presidente Ernesto Geisel é, até hoje, mais de uma década após sua morte, estigmatizado por ter dito que em sua época, o Brasil vivia numa democracia relativa. Não disse isso através de nenhum assessor para desmentir depois, ou dizer que ele teria escrito sem pensar, mas não tinha lido.

Nada é mais relativizado sem ser admitido hoje em dia, do que o conceito dos direitos humanos. E relativizar só serve àqueles que querem acomodar os princípios e valores da sociedade aos próprios interesses.
Quando isso acontece, só passam a ter “direitos” os escolhidos aos quais se concedem algumas regalias. Nunca são concessões por mérito ou direitos. Apenas são graduadas conforme o papel que cada grupo ou indivíduo representa no esquema de poder e cobradas quando convém. Assim, formam-se grupos com “direitos”, convivendo com grupos de excluídos de direitos dentro da mesma sociedade. A relativização de valores é o mesmo que relativizar a verdade. Nunca é demais voltar a Robert Musil em “O homem sem qualidades”: Não há nenhum pensamento importante que a burrice não saiba usar, ela é móvel para todos os lados e sabe usar todos os trajes da verdade. A verdade, porém, tem apenas um vestido de cada vez e só um caminho, e está sempre em desvantagem.”

Em desvantagem há quatro anos, os trabalhadores e aposentados da Varig/Aerus, que falam a verdade, não só de seu passado como pessoas decentes, que deram sua contribuição ao desenvolvimento do país, como quando rogam por seus direitos, cuja sistemática negação por parte das autoridades acarreta essa outra triste verdade, que é a situação dramática em que hoje se encontram. Um aumento de quase 50% na taxa de mortalidade desses aposentados nos últimos quatro anos, já devia envergonhar o mais desleixado dos governantes. Mas não por aqui.

Portanto, Uma Comissão da Verdade, de verdade, está fazendo falta para apurar as irregularidades que culminaram com as até hoje, não esclarecidas “vendas da Varig”, que impuseram perdas de recursos ao país, exportação de mão de obra qualificada e de alto custo de formação e, pior que tudo, um acachapante calote nos direitos trabalhistas e nas aposentadorias dos variguianos.

É curioso, sem deixar de ser trágico, esse mesmo grupo que finge não existir um sério problema de DIREITOS HUMANOS como o dos variguianos, estar tão convencido de sua verdade e querer impor um sistema moral ao país. Primeiro de tudo, precisam entender que o poder por si só, não define o que é moral.

Winston Smith em “1984”, de George Orwell, diz: “Liberdade, é a liberdade de dizer que dois mais dois é igual a quatro. Se isto for concedido, todo o resto se segue.” (Essa é a presunção dos que se acham sempre certos)

Se outras pessoas vão definir meus direitos, eu preferia que não estivessem sempre tão certas de estarem certas. A incerteza admitida e a capacidade de ouvir, é a disposição de ser mais justo e não indeciso ou desorientado – mas de não se achar infalível. Não podemos esperar para ter certeza e falar a verdade, quando já é tarde demais e se sofre danos irreparáveis, como acontece com a gente, os variguianos.

Bolognese é Comissário de Vôo aposentado Varig/Aerus